segunda-feira, 26 de setembro de 2011


Certo dia de sol, numa cidade grande. Uma árvore atropelou uma menina. Anos mais tarde um jardim brotou em suas costas. Naquele dia, coisas pequenas iam dar certo, mas seu caminho foi interrompido. Nem sempre as coisas grandes ou pequenas dão certo. A menina ainda gosta de cravos. Mais por seu cheiro, que por seu nome. A mulher jardim ainda trava as costas. Nos momentos em que não acredita em si. Afinal, árvores atropelam pessoas apenas em contos de realismo fantástico ou filmes de terror.
Ah como é fácil se enganar na vida! Achando que o estranho é exterior. O estranho é o próprio real. Essa verdade que não me faz sentido. Que nunca nos obedece quando queremos. Mas ruma como uma nau perdida, num sem-sentido, nessa desrazão. Não adianta saber navegar, não adianta segurar o timão. Pois mesmo o rumo que resolvemos imprimir podem mudar nos deixando novamente a deriva.
Hoje não mudei o rumo. Mas as costas-jardim me atrapalham. Lembram-me que o real não pode ser engessado. Que o texto tem que ser liberado sem medo e, às vezes, sem forma, para depois de conformar e ter a forma que os outros esperam. Travo as costas por travar o texto, travar a ação. Não falta coragem ou vontade de continuar.
Era apenas preciso lembrar que diante do real nada se espera, nada se conforma. E principalmente que árvores atropelam pessoas.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Jardins de veredas que se bifurcam
Dos caminhos que trilhei
As feridas dos meus pés são de dentro para fora
A ex garçonete caminha por uma nova estrada.
Em tempo modernos retorna-se ao passado.
Passado não seu, mas dos outros.
Após longa volta talvez não haja retorno.

.....

Reta e distante até onde a vista alcança
Sorrir mesmo diante da adversidade.
Mesmo quando a única vontade é chorar e desistir.
Por vezes, olho para os meus pés machucados.
Essa caminhada não é fácil ou mesmo tranquila.
É uma estrada vazia, solitária.
Não por descaso ou abandono.
Sua solidão é contaminada por quem a trilha.
A falta de cor.
O silêncio.
Não a tornam triste.
Mais uma vez reitero minha escolha sem certeza.
Observo a explosão silenciosa da alvorada.
Onde não se vê nada novo.
A estrada continua em preto e branco.
Por escolha caminho sozinha.
O olhar perdido permanece.
Mas abre espaço para novos olhares.
Se agregam novas perspectivas.
A estrada é uma.
Mas mesmo com os pés ainda machucados,
quem a trilha não é mais a mesma.

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Acendeu um cigarro. Não que isso lhe ajudasse na espera. Mas iludia. Já havia preparado sua fala. Era um final. Um ponto final. Havia decidido assim, não voltaria atrás. Na noite insone anterior repassara tudo que precisava dizer. Todas as explicações que gostaria de dar. Estava sentada num bar conhecido. Velho conhecido dos dois. Em sua cabeça tocava a música. Dois violões e um acordeon. Um diálogo de adeus. Um adeus sem briga. Sem mágoa. Apenas a constatação de que algo acabou. Um algo, que por seu forte fim, não deixava restar nada. Apenas a tristeza do fim. Ele entrou. Já sabia o que ocorreria em seguida. Por alguns instantes apenas os olhos conversaram. E ambos assentiram. Não cabia palavras. Todo o discurso ensaiado se esvaziara. Não havia mais sentido. Dizer adeus não era fácil. Nunca o será. Ela por fim deixou o som sair. Você já sabe. Sim, ele respondeu. Ela apagou o cigarro. Não havia consumido nada. Não havia sentido nem em pedir a conta. Levantou. Passou a mão no cabelo. Olhou mais uma vez nos olhos dele. Vazio. Sentia a tristeza. Mas não havia mais nada. Teve a certeza, coisa que preferia sempre evitar, mas essa certeza era mais forte. Assim, fez o que faltava, o que achava devido e correto. Adeus. Se virou. A vontade era de virar para trás, tentar reconhecer algo que ainda restasse. Algo, uma faísca, que a fizesse se arrepender. Desistir. Mas sabia que não encontraria mais nada ali. Forçou-se a caminhar. Ir se distanciando. Não sem lágrimas. Afinal, por mais que já soubesse, ainda assim doía. E continuou caminhando. Resistindo ao desejo de procurar o que já não havia. A música: Milonga del Angel - http://www.reverbnation.com/artist/song_details/749407

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

As palavras fugiram de mim? Não, penso que as tenho tratado muito bem, com carinho. Não acho que possa as ter magoado para que isso justificasse uma fuga. Teriam então elas sido roubadas? Mas então, quem faria isso. E por qual motivo? Afinal palavras minhas não se encaixam bem nos textos de outros. Mesmo sem resposta sei que as palavras não estão por aqui. Aqui reina o silêncio. Será que ele, ah... talvez o silêncio as tenha espantado, ou as roubado. Esse vazio tão conhecido de outros tempos, que novamente me ronda sem que eu consiga evitá-lo. Exitem silêncios que gosto. No quarto, antes de dormir. No nascer do sol, quando tudo parece explodir, mas nada acontece. Diante do mar, quando por vezes me faltam as palavras pois preciso tomar folego. Mas o silêncio de hoje não se configura como estes. Não é um silêncio apaziguador da alma. É a falta de algo que me escapa. A falta de força para dizer. Um silêncio que vem do vazio do olhar perdido. Como se a musa de ar magoado despertasse e viesse me dizer que mais uma vez perdi minha chance. Que, por hora, não terei forças para resistir.