quarta-feira, 12 de agosto de 2009

A casa estava vazia há anos. Várias camadas de pó acumularam-se. Os forros sobre os móveis um dia foram brancos, mas já haviam amarelado. Vários comidos por traças. Esburacados.
As cordas do piano haviam se rompido. Tudo cheirava a pó, história e passado.
Onde havia existido um belo jardim, tudo estava seco. A terra trincada. A pouca umidade da região contribuíra pra que tudo ali definhasse.
O portão enferrujado a convidava a permanecer ali. Sem transpor os umbrais do passado.
Sempre temera retornar. Imaginara essa ação várias vezes. Adiara o momento. Fizera o máximo para não precisar ir ali.
Parada em frente ao portão, permitiu-se lembrar. Transportou-se ao passado. Sua avó, cuidando do jardim.
Horas e horas, aquela pessoa tão carinhosa de sua infância gastava catando as folhas caídas. Conversando com cada planta, cada folha. Era um jardim que causava inveja aos vizinhos. Muitas de suas amigas na infância evitavam entrar. Tinha medo do jardim. O diziam ser encantado. Ela nunca se importara, a bem da verdade, muitas vezes inventara histórias mirabolantes. E uma vez, tão tomada por suas próprias histórias quase morreu intoxicada. Riu por um instante. E nesse instante se esqueceu por que há tanto tempo não entrava ali. Era o que precisava. Deu um passo em direção ao portão. Queria correr por aquele jardim encantado. Mas o rangido do portão a trouxe a realidade. E com a mão tocando a fria grade deixou-se paralisar mais uma vez.
Na verdade quase tombou frente a tamanha descoordenação de movimentos. E assim. Quando se deu conta, percebeu que o que a sustentava, era o portão. Aquelas grades de ferro suportavam seu peso. E ela não desmoronou em frente a casa apenas por seu auxílio.
Não! Não podia agüentar aquilo. Não era a hora de entrar. Não estava preparada.
Lentamente foi se aproximando do chão. Permitindo que a atração à terra fosse mais forte que ela. Não tinha forças para resistir mais. Logo estava de joelhos. Mas precisava se aproximar ainda mais daquela terra ressequida. Queria senti-la nas mãos, na barriga, no rosto.
Deitou-se no chão.
Em frente ao velho portão deitou-se apenas.
Não olhava o céu. Seu rosto, voltado para a terra, não via nada. Apenas se deixava ser invadida pelas lembranças. Sabia que não estava pronta. Mas não tinha como voltar. Não tinha meios para se fechar novamente do passado.
Agora tudo viria.
Respirou fundo. Inalava a terra. Junto o passado entrava em seu pulmão. Corria por suas veias. Preenchendo todo o seu corpo. Como um veneno que aos poucos a consumia.

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